Sombras de Silêncio #71

– E que relógio é esse? – questionou Carlos.

– O relógio não é importante. O que importa é o que tem no seu interior.

– E o que é?

– Isso não sei. O que eu sei é que a nossa Loja está a ser muito pressionada. Se roubaste o…

– Mas eu não roubei nada! – interrompeu Carlos, esforçando-se por parecer credível.

– Pronto, tem calma! Desculpa estar a importunar-te, mas enquanto isto não for resolvido não iremos ter sossego.

– Afinal, qual é a história por detrás desse relógio?

Afonso Pala não conhecia todos os pormenores. Ainda assim, após alguma hesitação, optou por esclarecer o amigo, sobretudo para o elucidar do perigo envolvente. Tudo terá começado com a iniciação maçónica de um padre. Durante alguns anos ninguém desconfiou das suas intenções. Contudo, no último mês, alguns homens começaram a rondar a casa de Oeiras. As suspeitas adensaram-se e o próprio grão-mestre começou a ser incomodado. Na origem de todas estas movimentações estava um manuscrito em latim adquirido há já muitos anos pela Loja. Num primeiro relance aparentava ser mais livro sobre o sentido da vida. Mas nas entrelinhas parecia conter alguns segredos, que o padre tentou desvendar até ao limite da sua imaginação. O problema surgiu quando as suas intenções começaram a ser seguidas por uma outra sociedade secreta. Ao aperceber-se disso, tomou precauções para que as suas descobertas não caíssem em mãos erradas e escondeu o relógio na biblioteca. Porém, não foi capaz de antecipar o quanto a tortura pode ser persuasiva, mesmo para quem acredita que o sofrimento é uma porta para o céu.

– O que aconteceu ao padre? – inquietou-se Carlos, suspeitando então que tomara a decisão acertada em não assumir o roubo.

– Não sabemos. Talvez já esteja no Tejo.

– Mas como é que eu me tornei no principal suspeito desse roubo?

– Por uma circunstância de azar. Quando eu te disse para ires procurar na biblioteca pela resolução daquele enigma não adivinhava no que te estava a meter. Também por isso, gostaria de te pedir desculpa.

– Pois, foste tu… que me enviaste para lá. Talvez alguém se esteja a aproveitar disso. Estou a ser acusado de algo que não fiz e ainda por cima destruíram-me a casa – indignou-se Carlos.

Sombras de Silêncio #71

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