Quando, há cerca de cinco anos atrás, percorremos as nossas Montanhas Nebulosas (GC3C7J6), estávamos então longe de imaginar que a experiência ganharia um lugar tão especial nas nossas memórias e no imaginário de quem gosta destas aventuras e se sente tentado a realizar o desafio. A ideia surgiu um pouco por acaso e sem um propósito definido. A cache e os seus pormenores apareceram apenas depois. O importante era o caminho e a experiência: atravessar o Parque Nacional Peneda-Gerês (PNPG), vagueando pelas serras Peneda, Soajo, Amarela e Gerês, aproximando o percurso à linha de fronteira, desde Castro Laboreiro até Pitões das Júnias.
Cinco anos volvidos, acalentei a esperança de voltar a realizar o percurso num único dia e em modo trail. Porém, à falta de companhia e da melhor preparação, acabei apenas por acompanhar os fantásticos resistentes no último dia da sua demanda, desde a Portela do Homem até Pitões das Júnias. A alvorada deu-se sem necessidade de o galo cantar e a horas impróprias. Cheguei à Portela às 7 da manhã, já num crescendo de expetativas. Após reencontrar os companheiros da aventura (Flora, Gustavo, José, Filipe, Bruno, Jorge e João), arrancámos cheios de coragem pelo trilho da Encosta do Sol. É um dos meus preferidos no Gerês e o melhor para alcançar o topo desta serra de encantos.
À medida que fomos subindo, o sol começou a surgir pelos montes e venceu as sombras. Ao longe, o Pé de Cabril foi um dos primeiros pontos a ser iluminado e parecia um farol que nos guiava pela serra. A albufeira de Vilarinho da Furna emergiu então no horizonte, formando com o Pé de Cabril um cenário muito fotogénico. Mais acima, a Pedra Furada, ainda pequena, mostrava-nos o caminho a seguir. Um outro ponto de interesse com este trilho prende-se com facto de estarmos a calcorrear a cumeada que fica sobre o vale do rio Homem, proporcionando assim muitos momentos de espanto vertiginoso. A passagem pela Pedra Furada assinalou sensivelmente o meio do caminho entre a Portela e o Pico da Nevosa e emoldurou-se como um dos locais mais icónicos de todo o percurso.
Monte atrás de monte, avistámos uma enorme roca que domina a encosta: a Laje do Sino, que eu erradamente pensava que seria o Altar dos Cabrões, referenciado pelo Torga. Enfrentámos depois a subida para o Pico Sobreiro, onde aproveitámos para almoçar as grandes vistas. Para chegarmos ao céu geresiano faltava apenas a subida para o Pico da Nevosa, o ponto mais alto do PNPG, que é muito reconfortante de alcançar. Dali sente-se a verdadeira imensidão solitária do Gerês profundo. Após uma passagem pelo vizinho Alto da Nevosa, na Serra do Xurés, descemos do planalto e fomos avançando sem grandes dificuldades, mas já tocados pelo cansaço. Avistámos a Fraga do Paúl e a Fonte Fria, na certeza que as maiores dificuldades estavam vencidas. Alcançámos depois o topo das Montanhas Nebulosas, num momento que teve tanto de incrível como de belo. O sol deslizava no horizonte para o ocaso e desenhava cores fantásticas nas nuvens.
Aproveitei para subir primeiro e fazer uma pequena alteração na localização do recipiente, tendo ficado agora mais acessível. Cinco anos volvidos desde a sua colocação, creio que sou agora uma pessoa mais ajuizada e temerária, visto que não me senti muito confortável para o alcançar na sua posição inicial. Quando os companheiros chegaram, foi fantástico sentir a sua felicidade por terem alcançado o merecido final para uma difícil caminhada de três dias pelo PNPG. Tornou-se um momento verdadeiramente memorável!
O pôr-do-sol incrível acabou por significar que o resto da caminhada até Pitões teria de ser feito entre o lusco-fusco e a escuridão. Porém, apesar do cansaço, creio que hoje ninguém trocaria aquele momento mágico ao pôr-do-sol pela possibilidade de terminar de dia. Seguindo o trilho restante, descemos para Pitões e fizemos a parte final já em descanso, um merecido prémio pelo esforço. No total, os 28 km demoraram cerca de 14 horas.
Se o percurso foi fantástico, o jantar e a pernoita prometiam ser épicos! Fomos revisitar o fascinante Mosteiro de Pitões das Júnias e partimos para mais uma edição memorável da Sopa da Pedra. Palavra para o magnífico trabalho do Américo, que foi inexcedível. Estou certo que todos guardaremos com um enorme sorriso na memória aquele jantar à volta da fogueira num cenário magnífico. Manhã cedo, arrumámos tudo, reconfortámos as barrigas e despedimo-nos de Pitões em busca dos banhos revigorantes de Lobios, onde fomos amenizar as mazelas do corpo. Sinceros e sentidos parabéns a todos pela forma hercúlea como venceram as vossas Montanhas Nebulosas e obrigado por terem tornando este desafio ainda mais especial!