Drave faz parte dos locais que gosto de visitar todos os anos. Existe algo de mágico nesta aldeia abandonada. Ali o tempo parece ter ficado perdido à procura do seu século e cada visita é um vislumbre do passado. À semelhança do ano anterior, regressei à Drave ao sabor do GeoTrail Montanhas Mágicas. Porém, desta vez optou-se por iniciar o trajeto na Pena, uma aldeia que conseguiu livrar-se do abandono pela construção de uma estrada. À Drave nunca chegaram estradas e é também isso que vai perpetuando a sua mística e encanto.
Quando cheguei à Pena já lá estavam os 10 intrépidos que iriam fazer o percurso completo. No total, esperavam-nos muitos quilómetros por montes e vales a perder de vista e de fôlego, literalmente. Tinham sido idealizados dois trilhos; o mais difícil englobava uma junção do Trilho Maia (17 km) com o Trilho Palhais (6 km). Depois de um café, iniciámos o percurso e seguimos pelo mítico Caminho Onde o Morto Matou o Vivo. Apesar de já ter passado várias vezes por ali é sempre impressionante transpor as portas de granito do vale e descer pelo trilho íngreme até à cascata. O local parece guardar o segredo luxuriante da vida.
Descendo o vale, furando pelo trilho sinuoso, seguimos em direção a Covas do Rio. Pelo caminho tivemos a oportunidade de encontrar alguns brinquedos que os habitantes da aldeia foram deixando a caminho dos campos. Mas nem todas surpresas foram boas; depois das conversas iniciais sobre as víboras que existem na região, a caminho da aldeia tivemos um encontro imediato com uma cobra, que descansava sobre um muro.
Passámos pela aldeia e subimos a encosta em direção a Covas do Monte. Os desenhos da orografia acidentada entravam pelos olhos e a sensação de pequenez ia aumentando. Os vales são profundos e as partes mais escondidas não chegam a ver o sol. Avistámos depois a aldeia, aninhada no sopé de um tempo que parece estar a fazer as malas para seguir viagem. Seguiu-se uma extenuante subida pelo Portal do Inferno, em que a mente se vai iludindo com uma proximidade falsa do cimo da encosta. Parece perto, mas nunca mais chega e exige muitos pingos de suor.
A chegada ao topo do Portal marcou o encontro com o segundo grupo, que iria percorrer o Trilho Palhais. Depois dos cumprimentos iniciámos a descida pela cascata da ribeira. Pelo meio surgiram algumas dificuldades de progressão. Tendo em conta a heterogeneidade do grupo, talvez a escolha do percurso não tivesse sido a mais oportuna. Porém, os participantes souberam vencer o desafio. A promessa do trilho foi sendo adiada a jusante da ribeira, mas lá acabou por concretizar-se. Já tinha passado em parte deste percurso, mas nunca tinha ido até à Drave por ali. Fiquei agradavelmente surpreendido e talvez venha a repetir, fazendo a subida desde a aldeia.
Qualquer que seja o caminho que se tome para a Drave, o seu avistamento é sempre um momento de encanto. Com esta abordagem, creio que já percorri todas as encostas e ribeiras que a criaram. E é sempre um regresso a uma essência perdida no tempo. Creio que de cada vez que um português encontra a Drave, redescobre séculos de nacionalidade, presa pelos contrafortes da Serra da Arada, num dos espaços mais edílicos do país.
À Drave já tinham chegado outros participantes do evento. Havia também muitos escuteiros por lá, que paulatinamente vão recuperando algumas casas da aldeia. Apesar de abandonada, apenas nas noites invernais está realmente só. O almoço volante na aldeia serviu para descansar e apreciar o cenário envolvente. Depois da foto, seguiu-se uma sobremesa exigente. Entre o trilho mais longo e o mais íngreme, a maioria acabou por escolher este último, seguindo pelo antigo caminho que fazia a ligação entre a Drave e Gourim. A subida da encosta deixou algumas marcas e o grupo esticou-se e dividiu-se.
Lá em cima, com a Serra da Arada estendida em encostas tamanhas, reencontrámos uma vista alargada sobre a paisagem envolvente. A partir daqui, os objetivos alteraram-se e os participantes seguiram o seu ritmo, atalhando conforme as circunstâncias. Seguindo pelo topo da encosta, contornámos os vislumbres sobre a Drave e descemos depois para a outra vertente, onde reencontrámos a ribeira de Palhais. Fiquei por ali mais algum tempo à espera da chegada dos últimos participantes e acabei por seguir à boleia para a Pena. Caiu entretanto um nevoeiro sebastiânico e paisagem fechou-se em silêncio. Chegado à aldeia ainda fui a tempo dos petiscos e das bebidas de conforto.
Terminou assim mais um GeoTrail Montanhas Mágicas. Apesar das peripécias, foi um bom dia pela montanha, de corridas e aventuras. Muito obrigado a todos pela presença!