Maratona do Vouga

Ecopista

Cerca de um ano e meio depois voltei a correr uma maratona. Após a fantástica e extenuante aventura na Maratona do Gerês em 2014, e em preparação para a Oh Meu Deus – Ultra Trail Serra da Estrela K100+, resolvi percorrer a Maratona do Vouga. Calma, não se trata (ainda) de uma prova oficial e fui em modo solitário. A ideia de percorrer esta distância mítica pela antiga e abandonada linha ferroviário do Vouginha surgiu no ano passado. Foi até criado um evento, mas devido a uma lesão tive de abandonar a corrida e contentar-me com a travessia em bicicleta. Porém, o desejo de concretizar esta distância foi-se mantendo e finalmente tornou-se realidade.

A meio de uma manhã soalheira lá pedi à Ana Valente para me levar até Paradela do Vouga, de onde faria o caminho de regresso a casa. Acho que ela se deverá ter sentido como aquelas pessoas que, por alguma razão, decidem abandonar os animais domésticos e levam-nos em viagem para sítios longínquos, onde depois os deixam à mercê da sorte. Muitos conseguem regressar a casa; eu também tinha essa esperança. Não sei o que ela poderá ter pensado, mas acho que de cada vez que eu lhe digo «Tive uma ideia!», os sinos da sua consciência deverão repinicar de desconfiança. Porém, cá vamos vivendo com as idiossincrasias que soubemos aceitar e acarinhar.

Ponte

Preparado para a começar a correr, fiz-me ao desafio com a certeza que conseguiria terminar, mas sabendo que iria sofrer pelo acréscimo de dificuldade em relação às distâncias a que estou habituado. O ponto de partida da aventura centrou-se na antiga estação ferroviária de Paradela, transformada entretanto em café. A parte inicial do percurso coincidiu com a Ecopista de Sever do Vouga, está pavimentada. Apesar de as sapatilhas preferirem o contacto com a terra, o pavimento acabou por facilitar um pouco a progressão. Depois, ao saltar de concelho, o percurso seguiu unicamente por estrada de terra (exceto no cruzamento com outras vias).

As pontes e os túneis foram-se sucedendo de forma natural, servindo também de desculpa para descansar, apreciar e fotografar os cenários envolventes. Como sabia que tinha muito pela frente, fui mantendo um ritmo calmo e sem grandes devaneios. A partir dos 30 km, já depois de um almoço improvisado em Oliveira de Frades, as pernas tornaram-se mais pesadas e São Pedro do Sul começou a parecer-me mais longínquo, como um entardecer de um sonho esquecido. Poucos quilómetros depois surgiram algumas dores nas costas, que vieram complicar a progressão. As causas podem ser variadas, desde o esforço exagerado à postura incorreta. Cada pontada de dor lembrava-me que ainda não tinha chegado aos 40 km e em junho vou ter uma prova com mais de 100 km. É exatamente por isso que gosto de correr. Gosto de passar por todas as fases de preparação para um desafio difícil, desde a esperança ténue ao desalento profundo. E sei que estou impaciente por reencontrar em mim todas essas fases no momento de cruzar a meta desejada e vencer o desafio proposto.

Albufeira de Ribeiradio - Rio Vouga

Os últimos quilómetros foram percorridos quase em modo automático. Lembrei-me então de uma conversa tida com um colega aquando da Maratona do Gerês. Dizia ele que existe uma regra para perceber se se está preparado para um determinado desafio do género (seja em caminhada ou corrida). O exemplo é para a maratona, mas pode ser adaptado a qualquer distância/desafio. Também, só fará sentido numa visão estritamente amadora. Uma maratona (cerca de 42 km) corre-se da seguinte forma:

  • 21 km com as pernas;
  • 14 km com a cabeça;
  • 7 km com o coração.

Ou seja, fazendo uma preparação num cenário/percurso parecido com o que se vai encontrar, deve-se estar preparado para fazer metade da distância sem que existam grandes problemas físicos (a correr e/ou a andar). É importante fazer uma gestão inteligente do esforço para se conseguir ultrapassar os 14 km seguintes (cuidar os joelhos, adequar o ritmo/esforço ao declive, etc). Em relação aos 7 km finais, não há preparação física que nos valha; apenas a motivação de superar o desafio.

Locomotiva

Tinha a esperança de conseguir terminar a Maratona do Vouga em menos de 4 horas, mas definitivamente não estava preparado para tal. Porém, ao chegar a casa pareceu-me que estava a chegar ao céu. E isso já me bastou. O que ganhei com isto? Mais um pouco de mim. O que é que isso significa? Sinceramente não sei, mas acho que vou continuar à procura da resposta.

Os números da aventura podem ser consultados clicando na imagem seguinte.

Percurso Strava

Maratona do Vouga

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