Em dia de regresso à Serra da Estrela e a caminho do sunrise@CântaroMagro_21, a escolha da caminhada de sábado acabou por recair num percurso circular entre a Torre e Alvoco da Serra, com subida pela temível Rota do Pastoreio (ver trilho). Fiz pela primeira e única vez esta subida no contexto do Oh Meu Deus – Ultra Trail Serra da Estrela – 100km, em 2016, e desde então crescera a curiosidade e a vontade de regressar. A descida para Alvoco acabou por recair na Serra da Alvoaça.
Ainda em viagem, a subida de carro desde Seia perspetivou um desapontamento crescente em forma de nevoeiro. À chegada à Torre não se via mais do que o imediato e um vento frio cruzava o planalto serrano. Felizmente, bastou cerca de uma hora para que o nevoeiro desaparecesse quase por completo, subsistindo um mar de nuvens no horizonte austral. Enfim, especificidades e contingências do microclima da Estrela.
Por suspeitar que ao baixar de altitude haveria de melhorar a sensação térmica optei por levar roupa mais veraneante. Segui então para sul em busca da cumeada da Serra de Alvoaça, que define a fronteira entre os distritos de Castelo Branco e Guarda. Após a zona do planalto, o trilho desce abruptamente por uma crista. Pelo desuso, nem sempre é fácil perceber por onde desce o trilho. Muitas vezes, a descida é feita pela melhor perspetiva de evolução, junto à crista, sendo que de ambos os lados a depressão vai-se acentuando.
Após uma grande descida inicial tornou-se mais fácil apanhar o trilho visto que a cumeada ainda é usada para pastoreio. Esta zona voltou a permitir alguma corrida, intercalada com paragens para fotos e geocaching. Após pequenas variações de relevo iniciei a subida para o VG dos Taloeiros. Quando lá cheguei parecia que todo o vento do mundo tinha sido direcionado para ali. Encostado ao vértice fiz uma primeira pausa e prossegui depois a longa e acentuada descida para Alvoco. A parte inicial, ainda num contexto de trilho individual, é bastante interessante. Próximo da Fonte da Pedra, onde a água brota diretamente do interior de um enorme rochedo, torna-se um pouco mais difícil perceber por onde segue o trilho. Após mais alguns lanços de interesse, o percurso acaba por desembocar num caminho que desce até à aldeia.
Já com um almoço reconfortante no pequeno parque junto à ponte sobre o rio Alvoco, comecei a subida de regresso pela Rota do Pastoreio. Estava então a cerca de 7 km e 1300 metros de altitude da Torre. Passei pela antiga escola primária e fui subindo num ritmo calmo. Apesar de ser sempre a subir, a parte inicial é menos inclinada e mais acessível. Nesta fase tive um encontro imediato com o rebanho que descia o trilho e fiz um pequeno desvio para não perturbar as cabras nem ser perturbado pelos cães.
A parte mais ingrime e difícil iniciou-se após cruzar a última ribeira, que no verão está seca. A partir dali o chão ergue-se inapelavelmente e pouco mais de 3 km sobe quase 1000 metros. Vieram então à memória as dificuldades e o sofrimento daquela subida aquando do Oh Meu Deus. Durante a prova cheguei a Alvoco já com cerca de 70 km nas pernas e aquela subida foi um desafio da dimensão da Estrela. A subida revelou-se difícil e obrigou a pequenas paragens para recuperar o fôlego e apreciar o grande vale. Agora não teria a mesma preparação, física e psicológica de quando fiz a prova, mas fiquei sem perceber como consegui resistir antes.
Quando cheguei ao planalto reencontrei o nevoeiro, o vento e o frio. Passei pela antiga casa da NATO de soslaio e terminei a caminhada com uma mudança de roupa. Para trás tinham ficado cerca de 18 km e 10 horas de Serra da Estrela. Fui refugiar-me por alguns momentos no Centro Comercial, enquanto esperava mais algum tempo para perceber se a meteorologia melhorava. Saí depois da Torre um pouco desanimado, convencido que o melhor seria adiar a experiência do nascer do sol, mas resolvi passar pelo Cântaro Magro. Já que não era viável ficar por lá, pelo menos queria subir ao seu cume e sentir aquela paisagem grandiosa.