Procurando balançar a viagem por terras de nuestros hermanos, para além da montanha, natureza e locais mais escondidos, também seguimos a maré turística habitual por lugares comuns. As escolhas mais naturais pela proximidade acabaram por recair em Ávila e Salamanca, duas cidades monumentais com inúmeros motivos de interesse. Sobre Ávila, convenhamos, a imagem muralhada da cidade é um postal de vistas impressionantes. Para além disso, quem gosta de turismo religioso tem aqui um petisco para ser descoberto e apreciado. Começámos logo por gostar da receção. Apesar de ser uma cidade bastante turística, foi muito fácil estacionar ao lado a oficina de turismo, junto à muralha. E o parquímetro? €0.60 bastou para o dia!
Mesmo ali ao lado, a basílica de S. Vicente ofereceu um primeiro olhar de espanto para edificação católica de Ávila. Não tem a dimensão da catedral, mas impressiona tanto pela antiguidade como pela decoração de pormenor. Em particular o mausoléu que descreve a história dos santos em pedra policromada parece uma banda desenhada intemporal. Porém, o maior e mais admirável edifício da cidade é a sua catedral, edificada como templo e fortaleza. Temos que nos afastar do motivo para que caiba na foto em todo o seu esplendor, considerada primeira catedral gótica de Espanha. O interior, impregnado de pormenores desenhados na rocha, arrebata a atenção a cada olhar.
Continuando a visita pela cidade, fomos almoçar num restaurante de uma rua que desemboca na praça da edilidade local. Que os mestres de culinária me perdoem se puderem, mas pela primeira vez na minha vida, de tão cheio, deixei um pudim por terminar. Estava tudo delicioso! Para desgastar, fomos percorrer as ruas da cidade ao sabor da história e investimos depois à descoberta daquele que será o principal postal da cidade: a muralha. De construção impressionante, fecha a cidade história em múltiplos pontos de interesse. Aceder a cada torreão é redescobrir uma nova vista que nos prende o olhar. No final, para termos uma visão inteira d’Ávila, seguimos para o miradouro Quatro Postes e completámos a imagem postal.
Já de regresso a este Portugal a cheirar a saudade, Salamanca é de passagem obrigatória. Depois de se entrar na cidade dourada, somos puxados para o centro histórico. Sair do carro e investir num ponto de interesse é um desafio, visto que tudo parece aliciante. De qualquer forma, a catedral talvez seja o principal motivo. Visitar estes locais deixa-me sempre com a as ideias balanceadas. Se por um lado fico subjugado pela imponência e beleza; por outro lado, com a minha alma agnóstica confortável com o pouco que sei sobre o tudo e o nada, sinto uma tendência a rejeitar toda aquela opulência, quando as palavras apontam, ou deveriam apontar, para a simplicidade. De qualquer, a história apenas pode ser compreendida no seu devido contexto. Fiquei um pouco mais reconfortado ao visitarmos a catedral velha e saímos à procura da história do astronauta. Curiosamente, apenas quando chegámos a casa é que percebemos que alguém tinha esculpido a imagem de um astronauta, ou pseudo-astronauta, numa das fachadas. Dividiram-se depois as teorias sobre o século em que o mesmo terá sido feito. Porém, nestas coisas, a explicação mais simples parece ser a correta.
Ainda que não tivéssemos encontrado o astronauta, com alguma ajuda lá conseguimos encontrar a rã na fachada de um dos edifícios da antiquíssima universidade. Como a aprendizagem é contínua, a sorte pode dar jeito. A visita à Casa das Conchas é também de visita obrigatória e aproveitámos depois para um passeio junto ao rio Tormes. Dois dias antes havíamo-lo encontrado um riacho sossegado de montanha, solitário no seu curso entre as fragas, e foi um prazer reencontrá-lo num leito grande e respeitoso, dando vida e cor à cidade dourada. Neste périplo ribeirinho, gostámos em particular de passar na milenar ponte romana e ver a cidade criada a partir do reflexo das águas.
Seguindo uma brisa de saudade, regressámos a Portugal. Cruzámos a fronteira e reencontrámos a autoestrada portajada, mas carente de manutenção. Ao longe avistámos também as nuvens que se erguiam de dois incêndios. Estávamos de volta a este alegre e fascinante fado!