Sombras de Silêncio #63

Nos primeiros dias da República Portuguesa, a festa de Lisboa espalhou-se pela província como se fosse um arraial estival. Celebrava-se a revolução como se fosse um milagre e até os mais desconfiados sonhavam com a perspetiva de Portugal recuperar o estatuto e a influência num mundo em constante mudança. Do nevoeiro emergiu a figura do respeitado açoriano Teófilo Braga, que se assumiu como chefe de um governo provisório cujas principais incumbências passavam por assegurar uma transição pacífica até que os políticos voltassem a entreter o povo com eleições. Do novo governo faziam parte, entre outros, António José de Almeida e Afonso Costa, sendo que uma das primeiras medidas foi promulgar uma lei que amnistiava todos os envolvidos em ações contra a monarquia, nomeadamente os regicidas, os bombistas, os exilados, os revolucionários e os grevistas. Neste contexto, foi com muito agrado que Carlos recebeu a notícia que a sua despromoção ficaria sem efeito, recuperando o posto de sargento e recebendo inclusive uma menção honrosa pelos serviços prestados.

Forçou-se a laicização do estado; os jesuítas foram expulsos; os bens da Igreja foram estatizados; a maioria dos clérigos que ocupavam posições nas diversas estratificações do poder em Portugal foi recambiada e concretizaram-se algumas correções às práticas correntes religiosas, designadamente na proibição de procissões para além do perímetro das igrejas. Os assuntos de Deus seriam afastados do círculo do poder visível no país. O governo criou ainda o Crédito Agrícola de forma a solucionar os problemas que grassavam numa agricultura quase feudal. Porém, a república ainda não estava sedimentada na consciência dos portugueses. Também, os interesses variados de outras nações poderiam proporcionar uma ocupação estrangeira das colónias africanas e asiáticas. Assim, tornava-se fundamental que houvesse um fortalecimento das forças armadas através de um serviço militar obrigatório que sustentasse um corpo miliciano capaz de defender a pátria. Suspeitava-se também que os espanhóis poderiam pôr em prática os ensinamentos que proliferavam nas suas escolas militares sobre como invadir Portugal.

Sombras de Silêncio #63

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