Sombras de Silêncio #20

Em abril de 1907, o regenerador liberal João Franco, que fora nomeado Primeiro-Ministro um ano antes, dissolveu o parlamento, tal era a ordem dos afrontamentos. À medida que a instabilidade crescia e a ditadura parecia inevitável, sucediam-se de todos os quadrantes pedidos a el-rei D. Carlos para que travasse a progressão das medidas de João Franco. Porém, o rei-caçador acreditava piamente no seu Primeiro-Ministro e não queria abdicar dos seus serviços, que confiava serem um escudo à monarquia. Por seu lado, el-rei já tinha problemas de sobra com os adiantamentos à casa real que lhe desgastaram a imagem de soberano. Apesar de o reino estar na bancarrota, ele insistia em se fazer representar como se ainda houvesse ouro a chegar do Brasil.

Para cobrir o dispêndio real, foi então necessário retirar dinheiro do erário público, o que provocou uma fúria ensurdecedora. Fora o próprio João Franco quem levantara e resolvera a questão dos adiantamentos, talvez como forma de garantia de um apoio incondicional do rei. Porém, os jornalistas de índole republicana não sustiveram a curiosidade; investigaram e concluíram que o dinheiro tinha servido para D. Carlos oferecer um prédio em Lisboa a uma amante, o que inflamou ainda mais os corações reacionários. Os jornais, revistas e outras publicações multiplicavam-se em afrontas a João Franco e sobretudo a D. Carlos, a quem acusavam de não conseguir suster o despotismo e apenas se preocupar com as suas caçadas, que não ajudavam a tirar a fome ao povo. Por outro lado, sempre que el-rei se intrometia na política do governo era também criticado, como se almejasse o absolutismo de outrora. Era um rei sem povo, encurralado pelas críticas.

No início de agosto, Joana recebeu a boa-nova de que estava grávida. Carlos passou então a avaliar diariamente o crescimento da barriga da sua esposa, esforçando-se para que ela não exagerasse no trabalho doméstico. Em setembro comprou um berço, que colocou no outro quarto. Ansiando por um rapaz, inquietava-se com a incerteza e torneava as esquinas da felicidade.

Sombras de Silêncio #20

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