Sombras de Silêncio #149

– Não sabia que agora a Guarda formava filósofos tão bem entendidos da vida, mas talvez vossemecê não devesse atirar julgamentos, sentenças e verborreias sem saber. O senhor guarda não conhece todas as linhas com que este jovem se cose. Deixe-o estar em paz que ele há de encontrar o seu caminho, na paz do Senhor – retorquiu o homem, aproximando-se de Miguel.

– Mas, senhor, foi o próprio comandante quem nos deu diretrizes para afugentar da cidade toda esta gentalha vadia que anda por aí ao abandono. Por certo, o doutor não quererá comprometer a execução das ordens dadas. Neste aspeto e sem trabalho, não é bem-vindo e terá de voltar para o buraco donde saiu – insistiu o guarda, resoluto, lançando uma olhar provocador.

O homem pôs-se então diante do guarda, ao lado de Miguel. Alguns estudantes, outrora divertidos, foram à sua vida, enquanto outros deram dois passos atrás, estarrecidos, à espera do final daquele folhetim.

– Ó senhor guarda, eu não quero intrometer-me na vida dos outros, mas fique a saber que se fosse eu que mandasse havia muita coisa que haveria de mudar – disse o homem.

– Então ainda bem que… – adiantou o guarda, completando mentalmente a sentença.

– Ó homem, deixe-me acabar. Este rapaz está aqui à minha responsabilidade. Vai ser entrevistado para um lugar de trabalho na limpeza das salas de aula da universidade. Porém, no caminho deve ter sido apanhado por um bando de malfeitores que o deixaram neste estado. Você, em vez de estar aqui a oferecer pancada ao coitado, deveria era tratar de cumprir o seu dever – concluiu o homem, levantando o queixo e a voz.

O guarda engoliu em seco e deu um passo atrás, reprimindo a vontade de lhe dar de imediato uma bastonada.

– E ainda aqui está? Vá atrás deles! A estas horas já devem ter passado a ponte de Santa Clara. Vamos, mexa as pernas! – vociferou o homem.

O guarda abriu caminho por entre os estudantes numa raiva contida. Quando já estava a mais de vez passos virou-se para trás e disse que haveria de voltar à universidade para saber qual tinha sido destino do rapaz. Prometeu ainda que, caso o encontrasse novamente naquele estado, haveria de o escorraçar aos pontapés até ao Mondego. O homem não lhe deu qualquer importância e ordenou aos estudantes para dispersarem.

– Mas que raio te aconteceu, ó desgraçado? Levanta-te e é se queres que te ajude.

Sombras de Silêncio #149

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