Depois de se inteirar da história trágica, também Miguel Girolme ficou devastado. Sabia que o mundo podia ser um antro de sofrimento, em particular no que diz respeito ao amor. Todavia, ficava sempre atormentado quando o sentia ou via. Voltou depois para o cemitério e desfilou os pontos coincidentes daquele episódio com a sua história, recordando o tempo em que trabalhara no circo e as situações a que fora sujeito por Hércules.
Quando, no final da tarde, Miguel regressou a casa, encontrou Bilinho onde o deixara, ressonando numa chinfrineira despreocupada. Foi depois buscar um pão de milho à viúva, deixando-lhe cinco tostões e voltou para o jantar. Quando acordou e soube da história, Bilinho mostrou-se também muito transtornado. Mas não revelou que fora ele o «desinso da fruta», como o Pintassilgo mais novo gostava de o chamar. Naquela noite, e com algum receio à mistura, Bilinho optou por não ir à taberna e voltou para a cama. O desaguisado também convenceu Girolme a não sair de casa para a sua ronda habitual.
Na manhã do dia seguinte, por volta das onze horas, um carro da Guarda saiu do posto em direção à casa de Tirinhos. Quando lá chegaram, o cenário dificilmente poderia ser mais desolador. Naquele fatídico dia, Sofia acordara bem cedo e, sem que alguém se apercebesse, foi ingerindo todo o tipo de venenos que encontrou. Acabou por sucumbir de forma angustiante. Quando o pai a encontrou, já prostrada, ficou sem reação, como se um muro de insensibilidade se tivesse erguido à sua volta. O seu olhar estava preso nas nódoas negras que ele lhe provocara no dia anterior. Logo que a mãe descobriu a tragédia, depois de a abraçar em desespero, correu para a vila a pedir ajuda. Mas já não havia algo a fazer. Sofia foi levada para o hospital e ainda no próprio dia foi realizada uma autópsia para esclarecer até que ponto os indícios de violência poderiam estar relacionados com a morte. Assim que recebeu a notícia da morte da sua amada, Marco desapareceu e durante todo o dia ninguém soube do seu paradeiro.
