– Mui bien. ¿Adónde vas? – replicou Pablo, coçando a cara e achando muito própria a chegada, tal era o trabalho que ainda havia para fazer na apanha da azeitona.
Miguel olhou de imediato para Gabriel, que lhe traduziu a questão.
– P’ra Espanha – disse Miguel, cada vez mais certo que o facto de aquela gente falar com palavras diferentes haveria de estar relacionado, de alguma maneira, com a distância.
– Pero es aquí. No te vas más delante – disse Pablo, rindo e fazendo rir.
– Mas você já está em Espanha. Para onde é que quer ir? Olhe que a Espanha é muito grande – perguntou-lhe, de novo, Gabriel.
Miguel ergueu os ombros e adiantou o pescoço. Por um prato e um colchão não lhe importava quão grande fosse, pois por ele ficaria mesmo por ali. Nem foi preciso que Gabriel traduzisse, mas havia um pormenor que poderia fazer a diferença no futuro:
– ¿Usted es comunista?
Miguel adiantou-se a Gabriel e garantiu desde logo que não era comunista; não conhecia comunistas e queria estar sempre longe dessa gente. Depois de Gabriel confirmar as evidências, Pablo abandonou a soleira da porta e foi cumprimentá-lo com um aperto de mão. Apesar do aspeto franzino, o espanhol não hesitou em propor-lhe trabalho, retribuindo-lhe com comida, dormida e algumas pesetas. Depois da tradução, Miguel abriu o sorriso e nem queria acreditar em tal oferta. Ainda que não soubesse o que eram as «pesetas», ajoelhou-se aos pés do espanhol e agradeceu-lhe a oportunidade. Mediante tal abnegação, Pablo arrependeu-se de ter adiantado o dinheiro, mas o desespero conferia-lhe uma boa margem de negociação na posteridade.
– Mira, Isabel, el portugués Joaquín nos envió a un empleado. Es muy útil – disse Pablo para a mulher, que entretanto aparecera à porta.
Isabel era um pouco mais alta que o marido, com os cabelos negros encaracolados que chegavam até aos ombros largos. Pablo e Isabel Sánchez tinham dois filhos. O mais velho, Paquito, já estava casado e vivia em Badajoz, onde era guardia civil. A irmã, Anita tinha apenas onze anos.
– A mi me parece débil y enfermo – respondeu Isabel, desconfiada.
– Al iniciar el trabajo es tan bueno como nuevo. Escucha lo que digo – volveu Pablo, dirigindo depois a palavra a Gabriel –, usted será responsable de explicar lo que está pasando aqui. Por la noche será más un compañero de dormir con vosotros en el molino. ¡Ahora trabajamos!