Sombras de Silêncio #231

– Mui bien. ¿Adónde vas? – replicou Pablo, coçando a cara e achando muito própria a chegada, tal era o trabalho que ainda havia para fazer na apanha da azeitona.

Miguel olhou de imediato para Gabriel, que lhe traduziu a questão.

– P’ra Espanha – disse Miguel, cada vez mais certo que o facto de aquela gente falar com palavras diferentes haveria de estar relacionado, de alguma maneira, com a distância.

– Pero es aquí. No te vas más delante – disse Pablo, rindo e fazendo rir.

– Mas você já está em Espanha. Para onde é que quer ir? Olhe que a Espanha é muito grande – perguntou-lhe, de novo, Gabriel.

Miguel ergueu os ombros e adiantou o pescoço. Por um prato e um colchão não lhe importava quão grande fosse, pois por ele ficaria mesmo por ali. Nem foi preciso que Gabriel traduzisse, mas havia um pormenor que poderia fazer a diferença no futuro:

– ¿Usted es comunista?

Miguel adiantou-se a Gabriel e garantiu desde logo que não era comunista; não conhecia comunistas e queria estar sempre longe dessa gente. Depois de Gabriel confirmar as evidências, Pablo abandonou a soleira da porta e foi cumprimentá-lo com um aperto de mão. Apesar do aspeto franzino, o espanhol não hesitou em propor-lhe trabalho, retribuindo-lhe com comida, dormida e algumas pesetas. Depois da tradução, Miguel abriu o sorriso e nem queria acreditar em tal oferta. Ainda que não soubesse o que eram as «pesetas», ajoelhou-se aos pés do espanhol e agradeceu-lhe a oportunidade. Mediante tal abnegação, Pablo arrependeu-se de ter adiantado o dinheiro, mas o desespero conferia-lhe uma boa margem de negociação na posteridade.

– Mira, Isabel, el portugués Joaquín nos envió a un empleado. Es muy útil – disse Pablo para a mulher, que entretanto aparecera à porta.

Isabel era um pouco mais alta que o marido, com os cabelos negros encaracolados que chegavam até aos ombros largos. Pablo e Isabel Sánchez tinham dois filhos. O mais velho, Paquito, já estava casado e vivia em Badajoz, onde era guardia civil. A irmã, Anita tinha apenas onze anos.

– A mi me parece débil y enfermo – respondeu Isabel, desconfiada.

– Al iniciar el trabajo es tan bueno como nuevo. Escucha lo que digo – volveu Pablo, dirigindo depois a palavra a Gabriel –, usted será responsable de explicar lo que está pasando aqui. Por la noche será más un compañero de dormir con vosotros en el molino. ¡Ahora trabajamos!

Sombras de Silêncio #231

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