Sombras de Silêncio #57

Carlos saiu de casa pela manhã deixando várias advertências a Joana. Nem as lágrimas ou as palavras angustiadas da esposa, enquanto segurava Miguel ao colo, detiveram Carlos de cumprir a sua vontade, obliterando o dever. Seguindo ordens de Afonso Pala, os militares revoltosos controlaram o quartel já depois do anoitecer, prendendo os oficiais que não aderiram ao movimento. Sem derramar sangue, a intentona foi conseguida, com a ajuda da inclusão, à socapa, muitos civis carbonários.

Apesar de alinhar nos propósitos do seu amigo, Carlos tinha dúvidas sobre a eficácia do movimento, amedrontado com as possíveis retaliações que a sua família poderia sofrer. Afonso Pala tentava acalmá-lo com a perspetiva de uma vitória, salientando que para derrubarem o regime bastaria conquistar Lisboa. Carlos contrapôs com a certeza de que os militares de Tomar e Santarém já deveriam estar a caminho da capital, mas o capitão esclareceu que os cabos dos telefones e dos telégrafos tinham sido cortados e as linhas ferroviárias sabotadas.

À chegada do comissário naval ao quartel de Campolide organizaram-se duas colunas militares. Pretendiam ir ao encontro de outros quartéis onde, supostamente, os oficiais residentes já teriam sublevado e organizado os praças. Deveriam depois seguir para Alcântara, de onde seria lançado o ataque final ao Paço das Necessidades e a el-rei, que estava ocupado com a receção do presidente da república brasileira, Hermes da Fonseca. Contudo, as pretensões revoltosas não tiveram sucesso. As forças da Guarda Municipal, apercebendo-se da revolução eminente, intervieram e colocaram-se no caminho, promovendo uma troca de tiros da qual apenas se registaram feridos ligeiros. Os militares revoltosos, liderados por Machado dos Santos, acabaram por se entrincheirar na rotunda que ficava junto ao parque Eduardo VII por volta das cinco da manhã do dia 4 de outubro. Contavam com cerca de quatrocentos homens, entre militares e civis, incluindo Carlos e Afonso. Entretanto, em Alcântara, os oficiais revolucionários da Marinha conseguiram tomar o controlo do quartel de marinheiros e dos três cruzadores fundeados no Tejo, esperando a chegada dos companheiros de armas para atacarem em força o Paço das Necessidades. Todavia, o apoio nunca chegou e os marinheiros deixaram-se ficar à espera do exército.

Sombras de Silêncio #57

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