Quem entra atualmente no fantástico mundo do geocaching poderá estranhar que os geocachers ainda continuem a usar recetores GPS (GPSr) dedicados. Tal admiração poderá inclusive comparar-se à passagem da utilização de mapas topográficos em papel para os GPSr. Desde o início do passatempo, em que era comum usarem-se mapas e outras informações em papel para complementar a informação dada pelos GPSr, até ao uso dos smartphones, o geocaching e os geocachers acompanharam a evolução tecnológica subjacente. E como será o geocaching daqui a 15 anos?
Conheci o geocaching numa fase em que encontrar uma cache significava, comummente, pegar num GPSr dedicado, onde já se tinha acesso a mapas topográficos, e ir em busca do recipiente. Bem, já sabemos que, para mal dos nossos pecados, até podemos ter acesso a mapas, à informação e à tecnologia mais recente, mas resiste na maioria de nós, geocachers, uma qualquer centelha de desorientação que nos leva a acreditar que o melhor acesso é em linha reta! Devaneios à parte, confesso que vi o aparecimento e a generalização dos smartphones no geocaching com alguma desconfiança. Neste artigo irei discorrer um pouco sobre a minha experiência na utilização de smartphones e GPSr dedicados. Não será uma comparação técnica, mas essencialmente de opinião.
Nas primeiras caches que encontrámos, como ainda não tínhamos um GPSr outdoor, resolvemos a falta com um GPSr de estrada. Nas caches que ficavam afastadas das estradas tínhamos de andar de um lado para o outro à espera que as coordenadas do aparelho coincidissem com as da cache. A grande aventura foi mesmo ir à descoberta da cache do Prado do Vidoal (GCWDDE), que começa junto à Portela de Leonte, na Serra do Gerês. O trilho sobe a encosta e o prado, uma das “portas” mais usadas para entrar no Gerês profundo, aparece cerca de dois quilómetros mais acima. Encontrar a cache com um GPSr de estrada foi, no mínimo, desafiante e engraçado.
No regresso dessa viagem aproveitámos de imediato para comprar um GPSr outdoor, um Garmin Dakota 20. Foi com este aparelho que vivemos a maioria das nossas aventuras. Ao longo do tempo, o Dakota demonstrou ser bastante fiável. É relativamente pequeno e fácil de transportar, permite-nos desenvolver um geocaching sem recurso a papéis e é bastante resistente. Foi colocado à prova em vários desafios e quase nunca desapontou. Contudo, não é perfeito. Por vezes seria muito conveniente ter acesso a imagens spoiler e a borracha que envolve o equipamento é relativamente frágil. Ainda assim, estávamos satisfeitos com o aparelho. Inclusive, no ano passado resolvemos dar-lhe uma nova “vida”, uma capa de proteção e um mosquetão, ficando o aparelho preparado para encontrar quantas caches possam existir por esse mundo fora. Desconhecíamos porém que uma mudança estaria para ocorrer na forma como praticamos o nosso geocaching.
Até há pouco tempo atrás não considerei o uso de um smartphone para o geocaching. Ainda que não soubesse ou compreendesse a razão, sentia um instinto natural para desconfiar do aparelho. Acho que em parte seria pelo facto de ter algum respeito pela tecnologia dedicada. Quando surgia alguma curiosidade na sua utilização, escutava sempre uma voz suspeitosa na consciência: «O quê, vais passar agora a usar esse aparelho frágil? Se lhe der uma nortada nem sabe de que terra é! Quero ver-te quando estiveres no meio de uma serra ou no fundo de um vale; que ajuda é que ele te vai dar? E a bateria? Nem me obrigues a falar da bateria! O geocaching deve ser praticado “à antiga”. E já tens sorte por não seres obrigado a levar as informações e os mapas em papel!»
Assim, fomos arrastando as descobertas com o GPSr dedicado. Porém, numa desatenção da consciência, acabei por ceder à curiosidade. As primeiras utilizações do smartphone no geocaching, usando o programa c:geo, revelaram-se promissoras. No primeiro dia julguei por bem não arriscar e comecei por encontrar um evento/almoço na Bairrada. Não tive qualquer dificuldade em acertar com a descoberta, mas surgiram alguns obstáculos ao levantar-me da mesa!
Com o tempo, apercebi-me das vantagens em utilizar o smartphone, em particular por permitir uma melhor leitura e interpretação da informação (incluindo imagens). Passei também a ter acesso a mais registos, já para não referir o facto de que o Dakota eliminava alguma informação das listagens mais longas (em particular nas earthcaches). Parece-me também que o smartphone acaba por simplificar a prática do geocaching aos membros básicos.
Contudo, à medida que utilizava o smartphone em situações distintas, numa fase de aprendizagem, tive algumas dificuldades quando foi necessária ou oportuna uma melhor interpretação dos locais através da análise das curvas de nível; sentia também falta de utilizar os tracks dos percursos em simultâneo com a prática do geocaching. Após mais alguma aprendizagem, comecei a utilizar o programa Locus para complementar o c:geo e essas dificuldades foram sendo ultrapassadas. Neste momento, creio que consigo fazer uma boa utilização do smartphone no geocaching, tendo em conta as suas potencialidades e as minhas necessidades. Apenas tinha a lamentar que, através de uma utilização regular, a bateria resistisse somente um dia. Porém, a desvantagem foi resolvida ao adquirir um pequeno carregador portátil. Logo que a necessidade aumente, em particular para alguma travessia em autonomia, estou a considerar adquirir um carregador portátil solar.
Uma das questões mais relevantes sobre a utilização dos smartphones no geocaching prende-se com a qualidade da receção do sinal e com o erro associado a qualquer geo-referenciação. Como sou desconfiado, tratei logo de fazer experiências e comparações em circunstâncias distintas. Porém, não cheguei a qualquer decisão indubitável. As diferenças dos resultados acabam por ser engolidas pela margem de erro associada a cada medição. Inclusive, em locais com uma margem de erro superior a 50 metros, pareceu-me que o smartphone originou melhores resultados. A experiência na procura de caches, muitas delas em terreno ou circunstâncias exigentes, levou-me a concluir que o smartphone pode ser tão eficaz como um GPSr dedicado (comparação geral). No fundo, esta questão é semelhante àquela que é colocada na fotografia: não são as melhores máquinas que tiram as melhores fotografias, mas sim os melhores fotógrafos!
Atualmente, o Dakota vai descansando das aventuras e quando saio para praticar geocaching levo apenas o smartphone. Nos primeiros tempos ainda tive uma réstia de cuidado na sua utilização, mas rapidamente foi testado em diferentes situações e terrenos, tendo sempre respondido à altura das exigências. Assim, estou rendido e confortável no uso do smartphone para praticar geocaching. Contudo, é bom saber que o GPSr dedicado está disponível para qualquer imprevisto. Até à próxima aventura, qualquer que seja o aparelho!
Artigo publicado na Geomagazine #15.