Sem o poder evitar, o seu pensamento acabou por descambar para a sua princesa e para a possibilidade, cada vez mais real, de nunca mais a ver. Lembrou-se depois da mãe e entristeceu como se fosse uma noite fria de inverno. Apesar de ter passado por muitos sítios, desde que tinha abandonado a sua mãe nomeara Ritinha como a sua terra. Aquele era o adeus definitivo. Porém, estava satisfeito por finalmente se ter livrado de um peso que o acompanhara desde que deixara a mulher que o emprestara ao mundo, desprezada à vontade de um homem malévolo. Continuava a recordar os pais com carinho e esperava que no reencontro lhe pudessem perdoar pela falha. Num relance de perceção exacerbada, pareceu-lhe que a sua mãe e Ritinha se tinham tornado uma só pessoa na sua consciência.
O tempo passava de forma vagarosa e Girolme aproveitou para repensar na vida que deixara quando subiu para o comboio em direção a Coimbra, arrepiando-se ao descobrir que por esse caminho nunca teria encontrado Ritinha. Considerou depois a hipótese de encontrar outra pessoa, já que também descobrira em si sentimentos insuspeitos sobre Ana Maria. Tal deixou-o muito confuso e foi com um oportunismo extraordinário que Alberto apareceu na sua V5 com um capacete de couro negro e fivela prateada.
Nos primeiros metros, Alberto foi gritando o itinerário que iriam seguir, salientando que passariam por Leiria e continuariam junto ao litoral até chegarem a Aveiro, invertendo então para o interior. Girolme, cheio de medo e assombro pelo modo como a mota se mantinha direita, ia anuindo, agarrado com abnegação à barriga do condutor, como se o destino da humanidade dependesse da sua sobrevivência à viagem. Pouco depois de saírem da vila, Alberto teve de parar e ensinar-lhe como se deveria colocar na mota. Aos poucos, Girolme lá se foi habituando ao transporte. Todavia, não conseguiu livrar-se do receio de cair.
Um pouco antes de chegarem a Pombal, e como a viagem já ia demorada, decidiram parar num restaurante que ficava à beira da estrada. O parque de estacionamento estava repleto de camiões e havia muitos motoristas a almoçar, enquanto outros dormiam nas respetivas cabines. Girolme e Alberto entraram no estabelecimento e encomendaram o menu do dia, fêvera de porco com arroz. Num dos cantos, em grande alarido, alguns homens discutiam futebol.