Sombras de Silêncio #316

– Mas ele ‘tá mesmo feliz? – perguntou Girolme, que não tinha percebido o que homem dissera, confundido com a referência às estrelas cadentes.

– Se está feliz? Olhe bem p’ra ele, parece que está a ver Nossa Senhora em Fátima! Está felicíssimo da vida! E tudo graças a isto que aqui tenho.

O homem das cores abriu de seguida o casaco e mostrou-lhe uma pequena saqueta de pó branco, um frasquinho com um líquido incolor e uma seringa.

– Mas como é que isso pode ser? Há coisas que só Deus é que pode ver ou fazer… quer dizer, parece-me – retorquiu Girolme, interessado em saber mais.

– Não seja tão… teimoso. Vamos deixar tudo p’ra Deus? Estamos na altura de agarrar a vida! Descobrimos o segredo da felicidade. Durante muitos anos esteve escondido, mas já foi dado ao povo. Após tantas vidas de sofrimento, finalmente qualquer um pode ser feliz. O céu é o limite… ou talvez não; parece que os americanos já chegaram à lua. Isto faz com que, sei lá… uma formiga pareça um unicórnio. Agora pense… tudo o que você desejou durante a sua vida pode ser agora concretizado. Qualquer coisa! Ora diga lá qual é o seu maior desejo?

– O meu quê? – perguntou Girolme.

– O seu maior desejo… aquilo que mais quer na vida.

– Eu queria… ou já quis… sei lá muito bem… estar com a… mas, quer dizer, eu até já tinha arranjado uma maneira de estar com ela; sabe, eu pensava nela e já estava, por isso… sei – disse Girolme, revirando os olhos entre o chão, o céu e o homem colorido, conforme as lembranças e os sonhos se iam misturando.

– Ó men, isso de só pensar está muito fora de moda!

– O que é que eu tenho de fazer? – perguntou Girolme, cada vez mais interessado.

– Na verdade, é muito simples. Está com sorte, pois eu tenho aqui tudo o que é preciso! Digo-lhe mais: como você me parece um bom homem, com jeitos no falar e no pensar, dos poucos que ainda andam por aí, estou disposto a oferecer-lhe o primeiro chuto.

– Eu, de chutos sei. Sabe, uma vez o meu amigo Bernardo levou-me à bola e eu até achei aquilo um bocado sem jeito.

Sombras de Silêncio #316

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