Girolme ficou por alguns instantes a indagar sobre o que haveria de fazer. Ao olhar para o lado vislumbrou os cravos e considerou que as pessoas haveriam de ficar mais contentes se recebessem as flores. Concluiu depois que todas as pessoas gostam de receber flores. Pegou então no balde e, ainda que a ideia pudesse parecer pueril e arriscada, e acreditou que assim poderia mudar a atitude dos ofensores. Inspirou então a coragem, abriu a porta e pegou num ramo de cravos para os oferecer. Muitos sorriram e continuaram, mas alguns consideraram o gesto como ofensivo.
– Oh homem, você tem os cinco aferidos? ‘Tá a brincar connosco?
Girolme não estava a brincar e sorriu. Começou a ficar bastante nervoso e, por instinto, retirou do bolso o pífaro e soprou o medo. Alguns homens aproximaram-se dele e, no meio da chinfrineira, foram trocando piadas sobre o que haveriam de fazer ao pide e ao pífaro. Girolme continuava a soprar, entrelaçando os dedos buliçosos no pífaro, à espera de uma clave de magia. Os homens começaram então a subir a escadaria, olhando de soslaio para o interior do prédio. À medida que os homens se iam aproximando, Girolme foi recuando para a porta. Mas acabou por ser rodeado pelas suas intenções.
– Como estão diferentes estes pides! Agora já não andam com pistolas; trazem pífaros e tentam dar-nos música por todos estes anos de fascismo – disse um dos homens, de rosto severo, passando-lhe um braço por cima do ombro e tirando-lhe o pífaro com a outra mão.
– Por favor, nã me façam nada – implorou Girolme, aos tremeliques e verdadeiramente arrependido da façanha despropositada.
– Não?! Acha que sim, p’lo amor de Deus? Nós só viemos aqui para o ouvir tocar – respondeu-lhe outro.
– Mas eu sou só o porteiro – volveu Girolme.
– Então, e não vive aí? Com o resto da escumalha?
– Eu… vivo – confidenciou Girolme, baixando o olhar.
– Então vai pagar pelos outros… – disse outro, que já estava com o punho cerrado para lhe bater.
– Alto lá! – escutou-se. – Mas o que é que vossemecês estão a fazer?
Bernardo furou pela multidão e aproximou-se de Girolme com uma impetuosidade indomável.
– Ó velhote, chega-te para lá que este homem é um pide. Não te metas ou ainda vai sobrar para ti! – ameaçou o homem, de bigode farfalhudo e o rosto vermelho de raiva.