Sombras de Silêncio #232

Sem complicações ou imprevistos, Miguel foi integrado na quinta e começaria desde logo a trabalhar. Carlos não gostou da ideia de dividir o espaço da dormida com dois portugueses, mas permaneceu em silêncio. Gabriel, que ficara muito agradado com a chegada de Miguel, explicou-lhe desde logo as rotinas do dia-a-dia.

A quinta tinha quase sete hectares, especialmente talhados para a produção de azeite, com oliveiras dispostas em linhas paralelas entre si. Cultivavam ainda batatas, trigo e milho. Havia também alguns animais: um burro, duas vacas, um porco, algumas galinhas e um boi. Ao burro competia fazer rodar a nora e fornecer água para um tanque. Em função da existência do trator Lamborghini, de carroçaria e jantes vermelhas, aos outros animais nada mais era exigido do que comer, dormir e servir de alimento.

Enquanto Miguel conhecia a quinta, Pablo saiu de casa, já vestido para o trabalho, e pôs o trator a funcionar. Carregou o pequeno atrelado com sacas de serapilheira, toldos e baldes. Seguiu depois na direção do olival e os três homens foram atrás dele, cada um com uma vara. Miguel estava um pouco admirado, pois ali as pessoas andavam com os veículos no meio da terra cultivável. Sentia-se uma criança a redescobrir o mundo, com todas as suas surpresas e diferenças.

O trabalho era bastante rotineiro: ao chegarem a cada oliveira, estendiam os toldos e punham-se a bater até que todas as azeitonas tivessem caído. Contudo, o serviço também tinha os seus segredos. À primeira bordoada que Miguel endossou foi de tal modo acossado pelo patrão que, apesar de não compreender as palavras, percebeu a sua insatisfação. Gabriel explicou-lhe então que não podia bater de forma a partir as pernadas e os ramos. Depois do mal-entendido, Miguel passou a ter mais cuidado, sacudindo cuidadosamente a vara e esperando que a experiência lhe aguçasse a destreza. De seguida, separavam os ramos maiores das azeitonas e metiam-nos em sacos distintos. No final, recolhiam os toldos, apanhavam as azeitonas que tinham escapado e passavam para a próxima oliveira.

Sombras de Silêncio #232

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