Sombras de Silêncio #94

Após quase uma hora de interrogatório, entrou na sala o homem por quem todos esperavam. De imediato e em uníssono, os miúdos retomaram a choradeira.

– Mas afinal o que se passa aqui? – perguntou o professor.

– Pois! Se você soubesse é que era de admirar! – respondeu o sargento, ignorando as subserviências e devolvendo o tom ameaçador, o que causou grande estranheza ao tenente.

– Ó seu grande… por acaso perdeu a cabeça? Sabe com quem está a falar? – replicou o tenente, avançando em direção de Carlos.

O sargento não se coibiu e foi ao seu encontro com uma vontade inexorável de o fazer pagar pelo mal que fizeram ao filho. Quando o professor se apercebeu da determinação de Carlos, de olhar diamantizado pela raiva, inverteu a marcha e colocou-se atrás de uma mesa. Carlos ficou especado à sua frente, com as mãos debruçadas.

– Você quer saber o que estes diabos estavam a fazer ao meu filho? Crianças! Digam então o que estavam a fazer quando eu cheguei e ai de vocês que mintam!

O único que se atreveu a dizer alguma coisa foi Ricardinho, já sentado na sua cadeira, segurando uma camisa ensanguentada numa das mãos e usando a outra para acariciar o nariz, implorando ao professor para lhe acudir. Ainda com o sargento à sua frente, o professor não arriscou dizer ou fazer o que fosse, amedrontado pelas ações do sargento. Carlos vociferou depois o cenário que encontrou ao entrar na sala de aula, terminando com desconfianças sobre o que mais poderia ter acontecido.

Ficaram, pai e filho, com as lágrimas nos olhos, um de raiva e dando murros na mesa, outro de vergonha e com a cabeça enfiada entre os braços. Ao primeiro murro que o sargento dera na mesa, o professor assustou-se e chegou-se para trás, olhando à volta com a pretensão de que alguma criança negasse a versão.

– Eu… não sabia –  disse por fim o professor, num tom engasgado e tímido.

– Você não sabia?! Como haveria de saber?! Não é o seu filho, que lhe interessa o mal dos outros? – disparou Carlos.

– Senhor Carlos, eu sou aqui professor há muito tempo e sempre cumpri o meu papel. Não tenho culpa que esta maldita guerra tenha aparecido. Eu apenas cumpro ordens, nada mais! Se não está contente queixe-se aos superiores e logo verá o que lhe dizem – respondeu-lhe o tenente, à procura de recuperar o domínio da sala.

Sombras de Silêncio #94

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