– Ora viva, que o traz por cá? – perguntou José Francisco, nervoso.
– Deixe-se de coisas, homem! Conhece bem a razão. Ainda agora um dos seus lacaios me fez frente. Bandido! Exijo que pare com essas andanças que muito me têm custado, seu hipócrita – largou Carlos, de punhos cerrados e olhar intenso, apercebendo-se depois que, para além do anfitrião, estavam na sala outras pessoas suas conhecidas.
Enquanto o médico António José de Almeida, de bigode meticulosamente encurvado, se afligia com o alarido criado, Afonso Pala lamentava a inoportunidade da sua presença.
– Não se esqueça que está em minha casa! E eu não tolero insinuações nem ameaças, pois aqui tenho a lei de Deus e dos homens do meu lado. Juro por tudo o que é sagrado que não me responsabilizo pelas minhas ações. Tome tento na língua ou eu próprio lho darei – respondeu José Francisco, dando um passo na direção do hóspede indesejado.
– Tome tento o senhor, que esse paleio fiado não me mete medo. Avance! – gritou Carlos, investindo na direção de José Francisco de punho cerrado, encorajado pela raiva.
Nesse momento, Afonso Pala intrometeu-se e, esticando os braços na direção dos envolvidos, tardou as progressões. Importunados pela interferência do capitão, ambos tentaram esquivar-se e prosseguir com as suas intenções. Fazendo uso da sua postura mais atlética, Carlos conseguiu desferir um empurrão severo no opositor, que caiu desamparado sobre uma mesa de pinho. Enquanto o médico acudiu de imediato em auxílio do amigo, Afonso Pala conseguiu afastar o cabo por momentos, que passou a deambular perdido pela sala. À algazarra juntaram-se Ana, esposa de José Francisco, e a criada.
– Mas, afinal, o que se passa aqui? José, como está o senhor meu marido? – perguntou a anfitriã, ao ver tamanho alarido.
José, que estava a tentar levantar-se com a ajuda do médico, tinha outras preocupações e nem prestou atenção às palavras da sua esposa.
– Maldito! Exijo um duelo! – gritou José Francisco.
Os altercadores miravam-se em cantos opostos da sala com olhares revirados pela raiva. As ideias fluíam freneticamente, fazendo rebentar a cada instante cenários bélicos na mente dos opositores, como o borbulhar de água em constante ebulição. José notou então na esposa e ordenou à criada que a levasse para o quarto. Voltou-se depois para Carlos e insistiu no duelo.
– Eu não sou homem de cobardias. Não sabe com quem fala? Já passei por tanto, que não é um borra-botas que me irá fazer frente. Se não está contente com a vida que tem, então venha de lá…