Miguel desconhecia que conversar com uma rapariga pudesse ser tão difícil. No meio de alguma desorientação, quis revelar que, ao contrário do que alguns pensavam dele, era uma pessoa esperta e capaz de discutir de forma inteligente qualquer assunto. Começou então por dizer aos tropeções que deveriam ter algum cuidado com os peixes do rio, justificando-se com o facto de que Deus deitara o sal na água do mar para nos avisar onde se devia pescar, estando o animal já temperado. Cristina estava admirada com o que Miguel dizia, ciente de que ele seria ainda menos ajuizado do que ela inicialmente julgara. Ele, fundado nos sorrisos dela, sentiu-se incentivado a continuar as dissertações sobre a vida e as suas patranhas. Ela já pouco escutava, visualizando outros cenários mais ternurentos.
Quando Cristina notou que a irmã e Simão tinham abandonado a pescaria e aproximavam-se em carinhos, quis também aproveitar a oportunidade. Como era a irmã mais velha, seria até vergonhoso ficar atrás nas investidas amorosas. À sombra dos amieiros, fincou os braços na terra e foi dando pulinhos ligeiros até se colocar ao lado de Miguel, pousando depois a mão direita sobre o joelho dele, acariciando-o. Ele entesou as mãos na cana e ficou assustado com o acometimento, espreitando de soslaio para Cristina. Acabou apenas por sorrir. Cristina sorriu também e foi baloiçando a mão pela perna dele, pousando-a depois sobre as virilhas e apertou com alguma força. Ele sentiu um arrepio tremendo e impulsionou instintivamente os braços para trás, retirando à pressa o fio da água. Acidentalmente, o anzol ficou presou na cara dela e Cristina caiu para trás com as dores, gritando para lhe acudirem.
Assustado e sem saber o que fazer, Miguel levantou-se e ficou a vê-la contorcer-se, tentando retirar o anzol. Simão e Clotilde vieram logo em seu auxílio e ele conseguiu livrá-la da agonia, deixando-lhe um rasto de sangue na cara. Ainda dorida e com o orgulho ferido, Cristina desatou a enunciar alguns nomes menos próprios, culpando Miguel pela situação e adiantando que os dois nunca haveriam de namorar. Miguel ficou bastante confuso com as alarvidades bestiais que ia escutando, mas não reagiu. Apesar do revés, que de certeza iria entristecer a mãe, Miguel considerou que o fim do namoro talvez não fosse assim tão mau. Concluiu que as mulheres davam muito trabalho para conquistar e depois, ainda que parecessem disponíveis e afáveis, eram difíceis de contentar. Cristina pediu depois à irmã que a acompanhasse no regresso a casa. Simão, receoso pelos desenvolvimentos, correu atrás delas para minimizar os estragos provocados pelo primo, receoso que Ventura quisesse manter a ideia matrimonial inicial.