Joana regressou para junto dos seus pertences, devastada pela perda do amigo, recordando as suas palavras apocalípticas e pedindo aos céus para que a poupassem de mais tragédias. À chegada do comboio, carregaram as sacas e os caixotes no vagão das mercadorias e entraram. Deixaram sete anos de uma estadia agradável nos primórdios, mas dolorosa na despedida.
A viagem foi curta, demasiado curta para quem queria que o comboio sofresse alguma avaria nos travões e apenas parasse na capital, desembocando na vida feliz lá tinham deixado. Porém, saíram em Vila Nova da Rainha, numa curva do Tejo, entre a Azambuja e o Carregado, onde o Santo Condestável contraiu matrimónio e onde se deram os primeiros passos lusos na conquista do céu. O empregado descarregou-lhes os pertences e o comboio partiu logo de seguida, despreocupado com as misérias dos outros. Como não conseguiam carregar tudo o que tinham trazido, Joana deixou Miguel de guarda na estação ferroviária e seguiu em direção ao centro da aldeia. Prosseguiu na estrada para a Azambuja e quinhentas mágoas depois encontrou a casa do sogro. A família estava a almoçar, mas todos se disponibilizaram para ajudar.
A quinta era um quadrilátero de trabalho, com pouco mais de um hectare e encabeçada pela casa onde todos viviam. Fora construída por Manuel logo após o seu casamento com Joaquina, entretanto falecida. A habitação era revestida por um branco imaculado e as esquinas tinham uma risca azul. Possuía três pisos, ocupados respetivamente por animais, pessoas e batatas. O rés-do-chão compreendia um lagar e vários pipos de vinho, dispostos do maior para o menor; um dos cantos era usado para guardar as alfaias agrícolas e três arcas de milho e trigo. O pátio era parcialmente coberto por uma parreira e encimado por uma laranjeira, com amontoados de estrume e vários currais de animais; a latrina, que era na realidade um balde a ser usado apenas quando estivesse a chover, situava-se entre o porco e os coelhos. Subindo a escadaria chegava-se a um terraço, em parte coberto pelo telhado e embelezado por vários jarros de flores diversas; no terraço havia uma porta para a cozinha e outra para a sala, que por sua vez ligava aos três quartos. A cozinha era dominada por uma chaminé de pedra; pela cozinha podia subir-se ao sótão, um espaço obscuro onde eram depositadas as batatas. No centro da sala havia uma mesa grande de madeira, coberta por uma toalha de linho com bordados comprada em Arraiolos. Manuel dormia no quarto com a janela voltada para o Tejo, porquanto Arnaldo e Cina dormiam noutro e Simão no que restava, ambos mais pequenos e sem janelas, tendo somente espaço para uma cómoda e um armário.