Indiana Jones and the Mysterious Waterfall

capa

Há mais de 6 anos atrás descobrimos algo que nos despertou muita curiosidade e interesse: o geocaching. Para quem nunca ouviu falar, poderá ficar a saber mais sobre este passatempo aqui. Desde então somámos bastantes amigos e inúmeras estórias de descobertas e aventuras que moldaram a forma como organizamos o nosso tempo livre. Depois de muitas caches encontradas e colocadas, um dos aspetos mais marcantes prende-se com retorno que recebemos, através dos registos, das pessoas que visitam as nossas caches. Muitos acabam por ser absolutamente espetaculares, não apenas pela qualidade da escrita, mas também pela descrição sentida da experiência. Assim, resolvi divulgar esse manancial descritivo, verdadeiros capítulos de literatura e aventura.

A primeira cache escolhida para esta nova rubrica é a Indiana Jones and the mysterious waterfall. Sem grandes rodeios, esta é uma cache que nos é especial. Foi criada em junho de 2012 em conjunto com o Napoleão e o Daraopedal. Recordo a primeira vez que, numa magnífica aventura, cheguei ao local onde está a cache. Sem exageros, senti o corpo a vibrar de emoção e adrenalina. Não é para menos! Afinal, não é todos os dias que se: percorre um trilho histórico, atravessa uma mina que revela uma bonita cascata, sobe o rio num percurso desafiante e interessante, encontra uma grande lagoa de cores inefáveis e se nada/escala até entrar numa gruta por detrás de uma cascata misteriosa.

A cache possui inúmeros registos com bastante qualidade, que muito agradecemos. O escolhido acabou por ser o mais recente, do Luís Serpa. O Luís e a Bárbara são um casal simpatiquíssimo e vivem nos Açores. Neste verão decidiram conhecer a Serra da Freita e a Serra da Estrela através do geocaching. Infelizmente, acabaram por ter de alterar os planos das caminhadas devido aos incêndios que deflagraram da Serra da Freita, mas conseguiram visitar os locais mais emblemáticos. Este é o fantástico registo do Luís:

lagoa

“Já sentiram a adrenalina a percorrer o corpo, levando-o a tremer desenfreadamente? Já sentiram o coração a pulsar contra o externo, como que o esmagando? Eu já, e é das melhores sensações que se pode ter. Se não tiveram, bem, sigam as pisadas desta cache.

Estas férias tinham sido programadas para fazer nomeadamente 3 caches, sendo que duas delas desenrolam-se na Serra da Freita, a Extreme Challenge e os 12 Trabalhos de Hércules. Duas caches numa lista elaborada há alguns anos, e que há muito tínhamos vontade de as fazer, sendo este o ano escolhido para tal aventura e epopeia. Todavia, devido aos incêndios que devastaram a Serra da Freita este Verão, tornaram inviáveis os nossos projectos, ficando perdidos sobre o que fazer.

Assim, em conversa com o Valente Cruz, que foi incansável connosco e uma grande ajuda, este deu uma lista com algumas caches que estariam salvas dos fogos e que valiam a pena de serem procuradas, em que esta constava nessa mesma lista.

Confesso que nunca me tinha cruzado com este tesouro, apesar de ter um título deveras cativante. Assim, ao abrir a listing e ler com atenção a tarefa proposta, só tive uma reacção, “HOLY SH*T, esta temos que fazer!”. É incrível, estou a escrever este log após meses de a ter encontrado e passo a passo estou a rever toda a aventura na minha cabeça e de como fenomenal esta foi. Há tanto para dizer que os pensamentos se sobrepõem às palavras que escrevo, mas tentarei no meu melhor descrever o quão magnífico é todo este verdadeiro tesouro, mas nem todo o vocabulário chegará para descrever a magnitude deste trabalho aqui desenvolvido.

mina

Como é costume deste owner, as suas listing são verdadeiras obras e arte. Já vi muitas listings, e muitos nomes de caches, mas criar uma listing e um nome que fique no ouvido e que leve as pessoas a não o esquecer não é fácil, e aqui, o António triunfa em ambas os aspectos, não só nos excelentes trabalhos desenvolvidos nas listings, mas também nos títulos dos seus projectos que ficam na memória e tornam-se inesquecíveis. Deixo logo aqui os parabéns por mais uma página de qualidade, fazendo jus ao trabalho de qualidade desenvolvido por ele e por todos os que já colaboraram com os seus projectos.

Mas passando ao terreno. Digamos que esta era uma das prioridades de topo para fazermos e não podíamos deixar passar a oportunidade de a procurar. Durante os dias que antecederam a sua conquista, ia sempre pesando no desafio que iríamos ter e confesso que sempre tive um ligeiro medo de não triunfar nesta tarefa, deixando um rasto de um nervosinho miúdo e uma inquietação de como uma criança que espera impacientemente pelo Natal.

No dia destinado a esta cache fizemos o trilho do Carteiro iniciando em Cabreiros. Um trilho deveras bonito, sempre acompanhado pelo som do Rio de Frades, que anunciava a sua presença, insinuando que mais cedo ou mais tarde iríamos cruzar com ele. Durante este percurso fomos encontrando várias pessoas, quase todas a realizar canyoning, comprovando que esta zona é realmente muito movimentada. E percebe-se o porquê, é um sítio mágico, enquanto se caminha por entre aqueles vales, agora queimados, mas que ainda exibem algum do seu verde majestoso, afastando-nos da civilização moderna, retrocedendo às nossas origens humildes. Como cereja no topo do bolo, o rio, e que rio! Entre as suas formas recortadas e as suas vertentes, este cria uma panóplia de figuras elegantes, enquanto galga as margens ao som de rufos e tambores. Uma verdadeira amostra que a força da natureza possui, mas também de como esta consegue ser esbelta na sua forma mais bruta. Alguém falou em diamantes? Espero que não, o que encontram aqui é uma riqueza bem maior. Qual o valor? Espero não ter ouvido bem, pois aqui não há números que quantifiquem este cenário e a conjunção dos elementos.

logoas

Após a realização do trilho do Carteiro e de uma pequena estadia em Rio de Frades no café da D. Isaura, fomos no encalço da Lost Nazi Mine, a fim de dar começo a esta aventura. Por descuido nosso, introduzimos uma coordenada errada no GPS, o que nos levou a uma entrada diferente desta mina, num local de difícil acesso. Assim, mais uma vez, tivemos que pedir um pequeno help desk ao António e percebemos que até que não estávamos muito desviados. A entrada desta mina fica ligeiramente afastada do trilho, em que é necessário embrenhar numa mata agora, quase toda queimada. Isto inspira um misto de sensações, perfeitamente enquadradas no espírito desta cache do Indiana Jones, quase que sentimos que caminhamos em direcção às portas do inferno com o intuito de trespassar as entranhas guardadas pelos anjos caídos. Contudo, o inferno não é quente, mas gélido! No fim deste pequeno trilho somos contemplados com uma pequena entrada por onde brota um fio de água, daqui sente-se um frio que nos bafeja a cara e nos penetra pelos ossos na tentativa de nos demover desta demanda. Mas estes espaços são por nós bem conhecidos, e se há coisa de que gostamos são grutas e minas abandonadas, por isso, lanternas em punho e toca a marchar para a escuridão.

Cá de fora, consegue-se vislumbrar a luz ao fim do túnel criando a falsa sensação de que está mesmo ali ao perto. Como estávamos enganados. Porém, isso não é nada negativo, pois permitiu-nos estar mais tempo neste ambiente que adoramos. Uma excelente obra de engenharia, que ainda perdura nos dias de hoje, relembrando-nos que as pessoas daquele tempo tiveram uma vida muito difícil trabalhando naquele ambiente volátil. Neste mundo somos isolados de todos os agentes externos, não há sons, não há luzes, não há pessoas, um pequeno mundo só nosso, em que inclusive já deixei bocados da minha carne neles, mas que independentemente regresso sempre.

Com a luz solar a nos abraçar fomos aproximando da saída em que somos cumprimentados pela cascata ali presente. Uma visão divinal para quem acaba de sair das entranhas da terra. O local ideal para albergar a cache Lost Nazi Mine.

cascata-da-mina-ii

Feita esta, era altura de focar a nossa atenção na Indiana Jones e realizar o caminho ascendente do rio. Curioso foi logo a seguir termos encontrado uma pequena clareira com pedras dispersas em assentos, e aí encontrarem-se algumas jovens, que deviam estar a fazer um convívio qualquer. Seriam bruxas à espera do Indiana para prepararem alguma armadilha? Espero que ele se salve, ou pelo menos o duplo ehehe.

Subir o Rio Frades é uma experiência única. Estar ali no meio daquela imensidão é uma sensação única, especialmente os pequenos obstáculos que se vai transpondo nesta viagem. Com algum cuidado, íamos ultrapassando as barreiras que iam surgindo pelo caminho recorrendo a uns pequenos passos de escalada, ficando com o rio como “colchão” de queda. É um percurso impressionante e só isto já é uma boa aventura.

A certa altura encontrámos um grupo de pessoas a realizar canyoning, contudo estas estavam vidradas em algo na água. Era uma cobra de tamanho médio, que transportava nas suas mandíbulas um peixe. Foi uma imagem interessante, mas também para termos algum cuidado extra para não cair na água naquela zona. Ao passarmos pelo grupo, estes acharam um bocado estranho o que faríamos ali com t-shirt e calções, até que um lá decidiu perguntar:

“Geochares?”.

“Sim.”

“Mas sabem que vão ter que nadar?”

“Sim, sabemos”.

“Mas sabem onde ela está?”

“Sim, sabemos que está na pequena gruta”.

E com um olhar incrédulo continuou a sua viagem com o restante grupo, mas deve ter ficado com a impressão que não sabíamos em que é que nos estávamos a meter. Claro que foi mais um incentivo para continuar a viagem e aventurar pelo rio.

poco-oito

Neste ponto já estávamos bastante perto da cache, estando se não estou em erro, a uns 120 metros desta. Porém, aqui a viagem tornou-se um pouco mais perigosa, já não encontrando apoios para andar fora da água. Foi aqui, à sombra de uma singela cascata que optámos por fazer o resto descalços para não molhar os sapatos, e logo na primeira passada, em terreno escorregadio, lá dei um passo de dança acabando sentado na água. Foi para provar a temperatura e constatar que estava fria, ou muito fria.

Estávamos quase. O coração já se apertava no peito devido à emoção, até que ei-la, a cascata vista nas inúmeras fotografias e na página da cache. Aquele paraíso à espera de ser encontrado. O cenário aqui presente é surreal e realmente faz lembrar um lugar que poderia albergar um filme do Indiana Jones. Faltava agora atingir aquela gruta. Com grande antecipação fomos despindo a roupa para entrar na água, que se encontrava bem gelada, como facas trespassando a carne atingindo todos os órgãos. Sabia que não podíamos estar muito tempo dentro de água com aquelas temperaturas, pois o risco de hipotermia estava presente. Todavia, é uma sensação fenomenal nadar naquele rio e na sua pequena lagoa.

cascata

Aos poucos fomos aproximando da cascata, em que o barulho da água a colapsar era cada vez maior. Ao chegar à rocha, esta água começou a fluir sobre nós e aí senti uma enorme agonia, em que quase não conseguia respirar. Não estava habituado a ter a água a bater assim no corpo, o que criou uma sensação de pânico, algo que nunca houvera sentido, obrigando-me a nadar para outra margem. Ficámos aí um pouco a pensar no que fazer, o que me fez duvidar de conseguirmos realizar esta cache. Mas não, não ia de mãos a abanar, recusei-me a deixar esta por fazer e não ia ser uma cascata que me ia impedir.

Voltei a nadar contra esta e aos poucos fui-me habituando a estar debaixo dela. Como estava dentro de água, não tinha apoios nos pés para fazer força com as pernas, mas com uma pequena pesquisa encontrei uma saliência na rocha que me permitia apoiar um pé, porém ainda restava fazer força suficiente para conseguir escalar este metro de parede. Olhar para cima era fútil, pois a água da cascata não permitia, o que me fez tactear em busca de uma boa presa para as mãos. Lá encontrei o que me pareceu ser um bom apoio, tentando içar-me até à entrada da gruta, mas todos os esforços estavam a ser inúteis e o corpo já se estava a sentir cansado, bem como alguns calafrios. Regressei à margem para descansar um pouco e sabia que já não teria muitas mais hipóteses. É agora! Um último esforço! Voltei a nadar de encontro à queda de água. Apoios colocados, e, força. Fui até aos limites do corpo e consegui alcançar a borda. Aí não conseguia levantar-me devido à água que caía nas minhas costas, mas rastejando entrei na gruta, deixando para trás a pressão da água possibilitando caminhar. Tremia por tudo o que era canto, não só devido ao frio, mas também devido à onda de adrenalina que percorria todo o meu corpo. Que local magnífico! É uma imponência aquela pequena gruta por trás daquela cascata, que mete um tremendo respeito. De dentro desta existe alguns jactos de água devido a infiltrações do rio, que fazem parecer que a qualquer momento a parede irá desabar exibindo toda a força do rio.

cascatas

Infelizmente não tinha caneta para assinar e já não conseguia voltar a sair para ir buscar esta, deixando apenas o nosso registo fotográfico na cascata. Porém, o verdadeiro registo foi na nossa memória. Esta foi sem dúvida uma das maiores aventuras que já tive. Nunca fiz uma cache que se quer assemelhasse a esta. Não foi só uma aventura bem completa desde trilhos pedestres, minas abandonadas, percorrer rios, nadar e escalar, mas foi tudo desenrolado num ambiente perfeito para isto tudo. Hoje vimos o coração da Serra da Freita e como este está a sarar, o que nos deixou encantados e fascinados com o que a natureza pode oferecer. É sem dúvida um grande tesouro da humanidade e é imperativo a preservar.

Após os meses que decorreram de quando fizemos esta cache, ainda de vez em quando comentamos este dia e como foi memorável. E durante estas conversas, não há altura nenhuma em que não deixamos transparecer um grande sorriso por termos embarcado nesta aventura. Sei que este log é grande e tentei pintar o melhor quadro possível a fim de não esquecer nenhum pormenor deste tesouro. Mas isto tudo são palavras e se lerem este log e ficarem com vontade de a procurar, uma coisa garanto, vão ainda ficar mais deslumbrados quando aí estiverem e perceberão que as meras palavras não fazem jus ao que encontrarão.

rio

Muito obrigado António por toda a ajuda que deste e por teres indicado esta pérola do geocaching Português e por me teres feito viver uma das maiores aventuras que já tive. Com isso, também deixo os meus parabéns por tamanho projecto. Está tudo muito bem pensado e não há nada que se possa apontar. Sabia que as tuas caches eram boas, mas foi depois de começar as realizar, que percebi que não são só simplesmente boas, são um marco, e é um enorme prazer as realizar, pois garantidamente não nos vamos arrepender.

Esta é daquelas caches em que sinto falta de ser premium, pois apenas um favorito é muito pouco para premiar esta cache.

Feita com Basousa

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©luisserpa
©luisserpa
Indiana Jones and the Mysterious Waterfall

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