Frankenstein

Finalmente li Frankenstein. Tarde, mas ainda a tempo. É bom ir às origens das histórias e sentir o vibrar da pena original aos nossos sentidos; perceber as motivações primárias e admirar uma criação distinta, nova e original. Por fim, lia a obra que garantiu a Mary Shelley um lugar na literatura universal. Muitas foram as adaptações ao cinema, mas ainda assim confesso que tinha algum desconhecimento sobre a história. A primeira de todas era julgar que o monstro se chamava Frankenstein. Na verdade, o livro conta de história de Victor Frankenstein, o homem que revirou a ciência do seu tempo com a criação inusitada de um ser disforme. O monstro não tem nome. Assim, incógnito, tem perdurado ao longo das décadas na nossa imaginação. Não será por acaso que tal acontece. Nos pesadelos, também não nomeamos os monstros que nos perseguem pelas sombras.

Depois de anos de estudo, Victor consegue acender a centelha da vida num ser conjugado por partes de defuntos, obtidas das entranhas de cemitérios soturnos. Logo após o feito sobrenatural, Victor rejeita a criação e foge da responsabilidade. Abandonada, mas com uma sensibilidade considerável, a criatura vai atrás do criador. Ao longe, pelas longas vigílias da solidão, acaba por inteirar-se da vida em sociedade e chega mesmo a aprender a falar. Como seria de esperar, acaba por ser descoberto e rejeitado vilmente.

Sedento de vingança pelo legado de rejeição, acaba por ceder ao lado mais negro, não apenas dele, mas também da humanidade. Como forma de mitigar a sua melancolia e solidão, chega a propor a Victor para que crie uma companheira semelhante para que pudesse enfrentar a eternidade num sorriso de parecenças. Apesar de estar inicialmente tentado a anuir, Victor acaba por recusar, vergado pela coincidência. Inicia-se então uma série de mortes que culmina numa persecução desterrada.

O criador persegue a criação para o frio do fim do mundo. E algo em nós percebe que nenhum vai regressar. Acabam por ser encontrados por um capitão aventureiro em viagem até aos limites da sua coragem, furando onde nenhum homem tinha estado. Aliás, a história é contada através das sucessivas cartas enviadas pelo capitão.

O livro redundou em inúmeras frases e citações marcantes. A que mais me cativou foi: «Tu és o meu criador, mas eu sou o teu dono. Obedece!». Transparece a ideia que, mais cedo ou mais tarde, acabaremos prisioneiros das coisas que criámos ou possuímos. Creio que a história é uma boa metáfora da vida. É também por isso que foi sobrevivendo ao tempo com distinção e é revisitada e adaptada com alguma regularidade. Todos nós temos os nossos monstros. Talvez um dos mais significativos seja a imagem de quem gostaríamos ser. Se não tivermos cuidado, seremos perseguidos pelas criaturas que criarmos.

Bons livros e boas leituras!  

Frankenstein

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